quarta-feira, 2 de setembro de 2009

1.3 PODER EXECUTIVO

1.3 PODER EXECUTIVO

- Poder Executivo: órgão constitucional responsável pela prática dos atos de chefia do Estado, de governo e de administração.
Esta Chefia compete ao Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado (art. 76), e compreende a Chefia civil da administração (burocracia administrativa) e a militar (Forças Armadas).
- sistema de governo: presidencialismo – início com a CF/EUA de 1787, concebido por Jay, Madson e Hamilton[1]. É um sistema de governo baseado unicamente na pessoa do Presidente da República.
No Brasil, o Presidencialismo é adotado desde a CF/1891 até hoje, com a CF/1988 (parlamentarismo somente de 02/09/1961 até 23.01.1963, introduzido pela EC 4 à CF/1946 e excluído pela EC 6 à CF/1946).

- características do presidencialismo:
a) concentração das funções executivas na figura do Presidente (executivo monocrático): chefia monocrática e unipessoal = Chefe de Estado (representa o País internacionalmente e corporifica a unidade interna do Estado – art. 84, VII e VIII, XIX)) e Chefe de Governo (gerência dos negócios internos de natureza política e administrativa, ou seja, exerce a liderança pelas orientações políticas gerais e pela direção da máquina administrativa – art. 84, I-VI, IX-XVIII, XX-XXVII). Os Ministros de Estado são meros auxiliares do Presidente, por ele livremente escolhidos e exonerados (ad nutum), sem necessidade de motivação.
No parlamentarismo, a Chefia de Estado é desempenhada pelo Monarca ou pelo Presidente e a Chefia de Governo pelo Primeiro Ministro.
b) maior delineamento na separação das funções executiva e legislativa, pela independência dos membros desses poderes: Presidente eleito para mandato certo e determinado, regra, geral, sem responsabilidade política perante o Legislativo (exceção: impeachment = responsabilidade jurídico-política).
O Parlamento/Poder Legislativo não pode afastar o Presidente ordinariamente, a não se em caso de impeachment; o Presidente não pode dissolver o Parlamento, como forma de afastar seus membros, pois também são eleitos para mandatos certos e determinados.
Já no Parlamentarismo, o Primeiro Ministro pode ser afastado pelo Parlamento por dois motivos: perda da maioria parlamentar e voto de desconfiança. Também o Parlamento pode ser dissolvido pelo Primeiro Ministro, que convocará novas eleições para legisladores e Chefe do Executivo (se este for Presidente – República Parlamentarista)
c) os poderes presidenciais derivam diretamente do povo (ou indiretamente, como é o caso dos EUA – presidente eleito por representantes do povo);
No Parlamentarismo, o Primeiro Ministro é aprovado pelo Parlamento e indicado pelo Chefe de Estado (Monarca ou Presidente).
d) Presidente possui prerrogativas e imunidades, garantias indispensáveis ao exercício da Chefia do Estado e do Governo de modo independente e imparcial (dentro dos limites do princípio da legalidade);
e) responsabilização do Presidente por crimes de responsabilidade e crimes comuns (derivação do Princípio Republicano).

1.3.1 Funções do Poder Executivo

- função típica: administrar a coisa pública (res publica), compreendendo não só a função de governo, relacionada às atribuições políticas de decisão, mas também a função meramente administrativa, pela qual desempenha as atividades de intervenção, fomento e serviço público;
- funções atípicas: legislativa e julgamento; além de gerir a coisa pública, o Poder Executivo também legisla (expedição de medidas provisórias, lei-delegadas, decretos) e julga (contencioso administrativo). Não confundir julgamento com jurisdição (esta somente compete ao Poder Judiciário).

1.3.2 Investidura e posse do Presidente da República

- requisitos para a candidatura à Presidência e Vice: já estudadas sob o título direitos políticos, em semestre anterior. Apenas para lembrar: ser brasileiro nato (art. 12, § 3°, I); estar no pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, § 3°, II); alistamento eleitoral (art. 14, § 3°, III); domicílio eleitoral na circunscrição (art. 14, § 3°, IV); filiação partidária (art. 14, § 3°, V e art. 77, § 2°); idade mínima de 35 anos (art. 14, § 3°, VI, a); não ser inalistável nem analfabeto (art. 14, § 4°); não ser inelegível nos termos do art. 14, § 7°).

- investidura: eleitos, Presidente e Vice, diretamente pelo povo: sufrágio universal, voto direito e secreto;
- ano anterior ao término do mandato presidencial vigente (art. 77), proibida mais de uma reeleição simultânea (art. 14, § 5.°);
- sistema eleitoral majoritário de dois turnos: considera-se eleito o candidato que obtiver a maioria absoluta dos votos válidos em primeiro turno (50% + 1, desconsiderando-se os nulos e os em branco); sem maioria absoluta dos votos válidos, far-se-á nova eleição em segundo turno, concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que obtiver a maioria dos votos válidos (50% + 1). Este é o sistema para escolha de Presidente, Governadores e Prefeitos em Municípios com mais de 200.000 eleitores. Em Municípios com menos de 200.000 eleitores não há segundo turno.
Caso de morte ou impedimento do mais votado antes de realizado o segundo turno, irão para a disputa, no segundo turno, o segundo mais votado e o terceiro mais votado. Caso haja empate entre eles, convocar-se-á ao segundo turno o mais idoso (art. 77, §§ 4° e 5°).
Caso de morte ou impedimento depois de eleito, mas antes da expedição do respectivo diploma: assume o Vice-Presidente, pois foi eleito juntamente com o Presidente.
- primeiro turno: primeiro domingo de outubro; - segundo turno: último domingo de outubro;
- requisitos para a candidatura ao cargo de Presidente e Vice: ser brasileiro nato; estar no pleno gozo dos direitos políticos; possuir alistamento militar; possuir filiação partidária; possuir idade mínima de 35 anos; não ser inelegível (art. 12, § 3.°; art. 14, §§ 3.° ao 7.°);

- posse do Presidente e seu Vice: 1.°/janeiro/ano seguinte, por sessão conjunta do CN – prestam compromisso de manter, defender e cumprir a CF, de observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil (art. 78). A propósito, atentar contra a Constituição é crime de responsabilidade (art. 85, caput).
Passados dez dias sem que o Presidente ou o Vice tenham tomado posse, o cargo será considerado vago (art. 78, par. único): desdobramentos possíveis:
a) se apenas o candidato a Vice não comparecer, sem motivo de força maior, assumirá o candidato a Presidente e exercerá integralmente o mandato sem vice;
b) se o candidato a Vice não comparecer, por motivo de força maior, assumirá o candidato a Presidente e o Vice será empossado assim que cessar a força maior;
c) caso o candidato a Presidente não compareça, sem motivo de força maior, o candidato a Vice assumirá e exercerá integralmente o mandato, também sem vice;
d) caso o candidato a Presidente não compareça por motivo de força maior, o candidato a Vice assume o cargo de Presidente temporariamente, até que o candidato a Presidente seja empossado;
e) se, passados dez dias, ambos não comparecerem por motivo de força maior, deverá ser adiada a posse até que algum deles seja empossado ao cargo de Presidente.

- mandato presidencial: de 4 anos, com início em 1.°/janeiro do ano seguinte às eleições (art. 82).

1.3.3 Impedimentos e Vacância

- cabe ao Vice-Presidente substituir o Presidente nos casos de impedimento e vacância deste (art. 79): impedimento, o Vice assume temporariamente; vacância, o Vice assume definitivamente, até completar-se o mandato;
- impedimento: afastamentos temporários do Presidente (licença, doença, férias, viagens).
Obs.: nem o Presidente nem o Vice poderão ausentar-se do País por mais de 15 dias, sem que tenham autorização do CN, sob pena de perda do cargo (art. 83);
- vacância: afastamento definitivo do Presidente (morte, renúncia, perda do cargo em razão de pena imposta por crime comum ou de responsabilidade);
- casos de impedimento ou vacância de ambos (Presidente e Vice), assumem a Presidência, nesta ordem, o Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado e o Presidente do Supremo Tribunal Federal, temporariamente (art.80), até que ocorra nova eleição, das seguintes formas (art. 81):
a) vagando os cargos nos dois primeiros anos do mandato, far-se-á nova eleição direta noventa dias após a última vacância (sufrágio universal, voto direto e secreto);
b) vagando os cargos nos dois últimos anos do mandato, a eleição será feita indiretamente pelo CN, na forma da lei, trinta dias depois da última vacância. Obs.: eleição indireta = exceção à regra do art. 14, caput, somente aceitável por ser determinada pelo constituinte originário.
Em ambos os casos, os eleitos completarão o mandato de seus antecessores (art. 81, § 2.°) – é o denominado mandato-tampão.
- qualquer um dos substitutos que assuma o cargo de Presidente poderá praticar todos os atos que competência deste, como adotar medidas provisórias, sancionar projetos, promulgar e publicar leis, nomear e exonerar Ministros de Estado etc.

1.3.4 Atribuições do Presidente da República

- atribuições: de Chefe de Estado e de Chefe de Governo - art. 84 (rol exemplificativo, nos termos do seu inciso XXVII).
Todas as atribuições do Presidente da República são extensíveis aos Governadores e Prefeitos, no que couber (Princípio Federativo).
- regra geral: são atribuições indelegáveis;
- exceção quanto à possibilidade de delegação de algumas das atribuições: parágrafo único do art. 84 (aos Ministros de Estado, ao Procurador Geral da República e ao Advogado-Geral da União) as atribuições dos incisos VI, XII e XXV, primeira parte).

1.3.5 Poder Regulamentar

- pode regulamentar em sentido estrito[2]: edição de decretos e regulamentos, que são normas gerais e abstratas infralegais (art. 84, IV), expedidas privativamente pelo Presidente da República.
São importante fonte de Direito Administrativo, uniformizando os procedimentos administrativos necessários à fiel execução da lei (princípio da igualdade no tratamento administrativo).
São atos secundários à lei, pois dependem da lei (ato primário); são hierarquicamente inferiores às leis, não podendo contrariá-la, sob pena de serem declarados ilegais, até mesmo pelo Pode Legislativo (art. 49, V), Também o próprio Poder Executivo tem o dever de controlar a legalidade de seus atos, assim como o Poder Judiciário.
Apenas o decreto autônomo é ato normativo primário, pois regulamenta diretamente dispositivos constitucionais.

- classificação desses atos:
a) decretos ou regulamentos de execução (art. 84, IV): finalidade de facilitar a execução das leis e de tornar efetivo o cumprimento da lei. Detalham a lei, mas sem alterar-lhe nem o texto, nem o espírito. Por isso, não podem alterar a lei, nem criar obrigações diversas das previstas pela disposição legislativa. Apenas explicam a lei.
São atos secundários, pois o ato primário é a lei.
b) decretos e regulamentos autorizados (ou delegados) (art. 84, IV): não se limitam a detalhar/explicar a lei, como os decretos de execução, mas complementam a lei, com base em expressa determinação nela contida. Trata-se de criação de regras não contidas na lei nem implicitamente, mas seguindo as diretrizes amplas traçadas na lei geral e abstrata.
Também são atos secundários, sendo ato primário a lei.
Para não ser inconstitucional, é preciso que preencha as seguintes condições:
- não pode tratar de matérias constitucionalmente reservada à lei;
- a lei deve estabelecer claramente as condições, os limites e os contornos da matéria a ser regulamentada;
- deve tratar de normas meramente técnicas, procedimentais, pois não podem criar, modificar nem extinguir direitos, na medida em que estas ações pertencem apenas à lei.
Costumam ter como destinatários órgãos administrativos de natureza eminentemente técnica, como a CVM, o CONTRAN, a ANVISA e demais agências reguladoras.
c) decretos autônomos (art. 84,VI): trata-se de atos primários, pois regulamentam diretamente a Constituição, podendo ser externos (quando contêm normas dirigidas aos cidadãos de modo geral) ou internos (dizem respeito à organização, competência e funcionamento da Administração Pública). Trata-se da denominada reserva de administração (matérias que somente podem ser reguladas por ato administrativo, ou seja, pelo Poder Executivo).
Pode o Presidente da República dispor diretamente, mediante decreto autônomo, sobre: I - a organização, competência e funcionamento da Administração Pública federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de funções ou cargos públicos (não vagos); II - a extinção de funções ou cargos públicos quando vagos.
Observa-se que esta competência, nos termos do art. 84, parágrafo único, pode ser delegada pelo Presidente aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União.
A previsão do decreto autônomo é automaticamente extensiva ao Poder Executivo dos Estados e dos Municípios (princípios federais extensíveis), sem necessidade de ser repetida nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas.
Obs.: pode-se constatar que a Constituição Federal, apesar de reservar a primazia, não concedeu o monopólio da função normativa ao Pode Legislativo, estabelecendo outras fontes normativas primárias, tanto no Executivo (medidas provisórias, decretos autônomos), quando ao Judiciário (poder normativo primário do Conselho Nacional de Justiça).

1.3.6 Vice-Presidência da República

- Vice-Presidente: cargo criado para substituição do Presidente em situações de impedimento e de vacância;
- não precisa ser do mesmo partido do Presidente:
a) crítica decorrente desta situação: em caso de assumir o cargo de Presidência, nem sempre haverá a continuidade da política ideológica administrativa escolhida pelo eleitor.
b) situação favorável: maior governabilidade ao Presidente, pois com as coligações para a escolha do Vice recebe maior apoio político.
- funções próprias/típicas: resultam da Constituição ou da lei complementar – substituição (art. 79) e sucessão do Presidente da República (art. 80); participação nos Conselho da República (art. 89, I) e de Defesa Nacional (art. 91, I); funções típicas de ordem legal previstas em lei complementar (art. 79, parágrafo único)
- funções impróprias/atípicas: auxiliar o Presidente, nos termos do art. 79, sempre que por ele for convocado para missões especiais.
Obs.: esta classificação em funções típicas e atípicas é de Alexandre de Moraes.

1.3.7 Órgãos auxiliares do Presidente da República

- Vice-Presidente, no desempenho de sua função atípica de auxiliar o Presidente sempre que por este for convocado;

- Ministros de Estado: os Ministros são auxiliares do Presidente no exercício do Poder Executivo e na direção superior da administração federal, por ele nomeados e exonerados ad nutum. Trata-se de cargo de provimento em comissão.
- requisitos: ser brasileiro ou português equiparado (da Defesa, somente brasileiro nato); ter mais de 21 anos; estar no pleno gozo dos direitos políticos;
- as atribuições constam no art. 87, parágrafo único: quanto ao inciso I, a “referenda” dos Ministros aos atos regulatórios do Presidente é objeto de discórdia doutrinária. Alguns alegam a obrigatoriedade (Alexandre de Moraes, Celso Ribeiro Bastos, André Ramos Tavares, Michel Temer) e outros a desnecessidade (Vicente Paulo, Marcelo Alexandrino, José Afonso Silva). O STF[3] pronunciou-se pela desnecessidade, uma vez que a CF não prevê nenhuma conseqüência à sua ausência; admitir a necessidade da referenda seria admitir que o Presidente não teria competência autônoma para editar decretos e regulamentos e, além disso, os decretos e regulamentos de execução são competência privativa do Presidente, indelegável, portanto.
O efeito da referenda é a possível responsabilização solidária do Presidente e do Ministro, mas sua ausência não interfere na validade ou eficácia do ato.
- criação e extinção de Ministérios e demais órgãos da AP federal: competência do CN, por lei, mediante sanção do Presidente da República (art. 88 e art. 48, XI) – exceção: quando houver Ministérios vagos, pois nos termos do art. 84, VI, b, é ato privativo do Presidente, por decreto, a extinção de funções ou cargos públicos quando vagos;
- organização e funcionamento de Ministérios: mediante decreto do Presidente é que se define a estrutura e atribuições dos Ministérios, desde que isso não acarrete aumento de despesas nem criação ou extinção de órgãos públicos (art. 84,VI, b);

- processo e julgamento dos Ministros:
a) crimes comuns: pelo STF, nos termos do art. 102, I, c;
b) crimes de responsabilidade (sem conexão com crimes presidenciais): pelo STF, nos termos do art. 102, I, c, sendo a legitimidade para a representação junto ao STF somente do Procurador-Geral da República (EC 32/2001).
c) crimes de responsabilidade conexos ao Presidente da República: Senado Federal, nos termos do art. 52, I.
- vide arts. 50, caput e § 2°; 58, III: ausência injustificada dos Ministros à convocação pela Câmara, Senado ou Comissões parlamentares considera-se crime de responsabilidade, assim como a recusa em fornecer informações ou o fornecimento de informações falsas.
Obs.: o foro privilegiado acaba quando cessar a investidura no cargo de Ministro.

- Conselho da República: órgão superior de consulta do Presidente da República, disciplinado nos arts. 89 e 90.
Convocado e presidido pelo Presidente (art. 84, XVIII), nos termos da Lei n. 8.041/1990, para consulta acerca de intervenção federal, estado de sítio, estado de defesa e demais questões relevantes à estabilidade das instituições democráticas.
Não vincula as decisões da Presidência da República, pois é órgão meramente consultivo.

- Conselho de Defesa Nacional: órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático e está disciplinado no art. 91.

1.3.8 Responsabilização do Presidente da República (arts. 85 e 86)

- responsabilização dos governantes é corolário do Princípio Republicano;
- Presidente é responsabilizável tanto por infrações político-administrativas (crime de responsabilidade) quanto por infrações penais comuns (crime comum).

Crimes de Responsabilidade próprios
- crimes de responsabilidade impróprios: previstos na legislação penal, com penas criminais, podendo ser cometidos por várias autoridades públicas (CP, arts. 312 a 326; 150, § 2°; 300; 301... + Dec.-Lei 201/1967; + Lei 4.898/65);
- crimes de responsabilidade próprios = infrações político-administrativas definidas em lei federal, que poderão resultar no impedimento para o exercício da função pública (impeachment). Neste caso, a pena é a perda do cargo.
- crimes de responsabilidade próprios do Presidente da República:
a) art. 85 (numerus apertus);
b) Lei 1.079/50, alterada pela Lei 10.028/2000 (crimes de responsabilidade do Presidente e de outras autoridades): ampliou as previsões do art. 85, caput, principalmente quanto às questões orçamentárias;
c) Súmula 722, STF: são da competência legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento.
Moraes[4] define os crimes de responsabilidade como infrações político-administrativas, definidas na legislação federal e cometidas no exercício da função, que atentam contra a existência da União, o livre exercício dos Poderes do Estado, a segurança interna do País, a probidade da Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais e o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

O processo do crime de responsabilidade se divide em duas partes: juízo de admissibilidade + processo e julgamento.
a) Juízo de admissibilidade (Tribunal de pronúncia):
- legitimidade para oferecer acusação à Câmara dos Deputados: qualquer cidadão (pleno gozo dos direitos políticos);
- Câmara = juízo político que verificará se a acusação é consistente e se admite o processo e julgamento – analisa a conveniência político-social da permanência do Presidente na condução dos negócios do Estado; não se limita à análise do possível cometimento (ou não) do crime de responsabilidade;
- Presidente = direito ao contraditório e à ampla defesa junto à CD, inclusive com produção de provas, pois é situação de acusação, sob pena de nulidade do procedimento (art. 5°, LV);
- votação dos deputados federais é nominal e aberta, sendo necessários votos de, no mínimo, 2/3 de todos eles para a admissibilidade da acusação;
b) Processo e julgamento (Tribunal de Julgamento):
- competência para processar e julgar o Presidente = Senado (art. 52, I), mediante autorização de 2/3 dos membros da Câmara dos Deputados (art. 51, I), sob a presidência do Presidente do STF (art. 52, parágrafo único) – Senado atua como órgão judicial híbrido (legisladores + julgador);
- admitida a denúncia pela CD, encaminha-se o processo ao Senado, que, necessariamente, deverá dar início ao julgamento;
- iniciado o julgamento pelo Senado, o Presidente é suspenso/afastado de suas funções; retornará às funções se for absolvido ou em 180 dias (mesmo sem decisão), até que se conclua o julgamento (art. 86, § 1°, II e § 2.°);
- a decisão do Senado também é eminentemente política (conveniência ou não do afastamento do Presidente do cargo); analisa-se a gravidade do crime cometido para se saber se há possibilidade ou não de continuidade do exercício das chefias de Estado, Governo e Administração pelo Presidente;
- condenado por crime de responsabilidade (2/3 dos membros do Senado, em votação nominal aberta) = impeachment: o condenado perde o mandato e resta inabilitado, por 8 anos, para o exercício de qualquer função pública (eletiva ou não), sem prejuízo das sanções judiciais cabíveis (art. 52, parágrafo único);
- a sentença do Senado é formalizada por meio da expedição de uma Resolução do Senado Federal (art. 15, Lei 1.079/50);
- impossibilidade de o Poder Judiciário decidir ou alterar decisão de mérito pelo Senado: o Senado, em processo de impeachment, age como órgão julgador, exercendo função jurisdicional recebida pela Constituição, e de cujas decisões não há recurso para nenhum tribunal. O Poder Judiciário somente pode apreciar questões formais e lesão ou ameaça de lesão dos demais direitos envolvidos no impeachment, como, por exemplo, o cerceamento de defesa, mas jamais o mérito (condenação ou absolvição pelo crime de responsabilidade);
- STF: (a) a renúncia não paralisa o processo de impeachment, nem evita a inabilitação de 8 anos; (b) iniciado o processo, não será extinto, mesmo que finde o mandato ou que deixe o cargo por renúncia; (c) o Poder Judiciário não poderá alterar a decisão do Senado no processo de impeachment – mérito é jurisdição exclusiva do Senado por determinação constitucional; interferência do Judiciário somente em questões de lesão a algum direito ou formalidade (ex.: lesão à ampla defesa e ao contraditório; descumprimento de formalidade regimental etc.)

Crimes comuns: o Presidente da República, em relação aos crimes comuns (até mesmo os dolosos contra a vida) e crimes eleitorais, dispõe de prerrogativas e imunidades, como forma de preservar a independência do Poder Executivo frente aos outros Poderes da República. Entretanto, ao contrário dos parlamentares, não dispõe de inviolabilidade material por suas palavras e opiniões, ainda que no exercício das funções presidenciais.
Normas procedimentais encontradas na Lei 8.038/90 e nos arts. 230 a 246 do Regimento Interno do STF.

- Imunidades formais: são de cunho processual e somam três:
(a) instauração do processo (crime comum ou de responsabilidade) somente se autorizado por 2/3 dos membros da CD (art. 86, caput). A denúncia é oferecida pelo Procurador-Geral da República;
- não impede a instauração de inquérito (procedimento investigatório) junto ao STF, com o objetivo de obtenção de dados probatórios, inclusive decretação da quebra de sigilo bancário.
(b) impedimento de prisões em flagrante ou cautelares antes de sentença condenatória (art. 86, § 3.°) proferida pelo STF.
(c) relativa e temporária irresponsabilidade pela prática de atos estranhos ao exercício das funções presidenciais, na vigência do mandato (art. 86, § 4.°): se o crime comum praticado não guardar conexão com o exercício das funções presidenciais, o Presidente somente poderá ser responsabilizado após o término do mandato, perante a Justiça Comum. Ressalta-se que é suspenso o prazo prescricional até o término do mandato.
- Ex.: homicídio com conexão às atividades presidenciais = processo pelo STF após autorização da CD; homicídio sem conexão às atividades presidenciais = processo pela Justiça Comum após o término do mandato.
Só haverá processo correndo contra o Presidente, nas questões criminais, quanto aos ilícitos praticados antes do mandato, ou durante, sem relação funcional.
- Prerrogativa de foro: após autorização da CD (2/3 de seus membros), o Presidente será processado: (a) por crime de responsabilidade, pelo Senado, sob presidência do Presidente do STF, necessariamente; (b) por crime comum, pelo STF, podendo este rejeitar a denúncia.
Recebida a denúncia ou queixa-crime pelo STF, o Presidente ficará afastado de suas funções, por até 180 dias (art. 86, § 2.°), sem prejuízo do regular prosseguimento do processo. Se condenado, sujeitar-se-á à prisão e terá suspensos seus direitos políticos. Como conseqüência reflexa, perderá o cargo (art. 15, III).
Findo o mandato, acaba a prerrogativa e os processos instaurados perante o STF devem ser imediatamente remetidos à Justiça Comum, para o regular prosseguimento do feito.
A competência do STF para processar e julgar originariamente o Presidente (art. 102, I b) alcança todas as modalidades de infrações penais (crimes eleitorais, dolosos contra a vida e penais), e desde que praticadas na vigência do mandato e que guardem conexão com o exercício das funções presidenciais (in officio ou proper officium), mas não os ilícitos civis. Caso contrário, será processado e julgado pela Justiça Comum, somente após o término do mandato (imunidade processual temporária).
Quanto às ações populares, ações civis públicas e ações por ato de improbidade administrativa, não há foro privilegiado, seguindo, estas ações, as regras normais de competência.
Todavia, em recente julgado (13/06/2007), o STF entendeu que, em se tratando de ação de improbidade administrativa (regulada pela Lei n° 8.429/1992), cujos pedidos envolvam perda da função ou suspensão de direitos políticos, se a autoridade requerida estiver entre aquelas para as quais haja forma própria de investidura e destituição prevista na Constituição, o foro será o da ação por crime de responsabilidade. Será competente o primeiro grau de jurisdição somente quando o pedido envolva apenas defesa do erário público.

Observação: aos Governadores de Estado e do DF, quanto aos crimes comuns, somente se aplica a primeira das imunidades processuais analisadas, ou seja, somente poderão ser julgados pelo STJ (art. 105, I, a) após prévia autorização da Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa por 2/3 de seus membros, mediante previsão nas respectivas Constituições estaduais e Lei Orgânica. Crimes de responsabilidade cometidos por Governadores: após autorização da Assembléia Legislativa, processados e julgados pelo Poder Legislativo estadual e pelo Poder Judiciário, nos termos da Constituição estadual e em observância à Lei federal 1.079/1950, art. 78, § 3° (Tribunal especial composto de 5 membros do legislativo, 5 desembargadores e o presidente do TJ, com direito a voto de desempate.
As outras duas imunidades concedidas ao Presidente da República (referente às prisões cautelares [art. 86, § 3.°] e à irresponsabilidade relativa por atos estranhos ao mandato [art. 86, § 4.°]) não se aplicam aos Governadores, por se tratar de prerrogativas inerentes ao Presidente da República, na qualidade de Chefe de Estado.[5] Constituições Estaduais que dispuseram em contrários tiveram os respectivos dispositivos declarados inconstitucionais pelo STF.
Aos Prefeitos municipais e responsabilidade criminal e política segue as seguintes regras:
I - foro privilegiado para julgamento de processos criminais: conforme entendimento jurisprudencial do STF, Súmula 702: “a competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau”.
(a) Tribunal de Justiça (art. 29, X):
- crimes sujeitos à competência da justiça local/comum/estadual (inclusive os crimes dolosos contra a vida, afastando a competência da primeira instância da Justiça Comum);
- crimes de responsabilidade impróprios (infrações penais, descritas no art. 1° do D-L 201/67, com penas privativas de liberdade);
- casos de processo e julgamento dos Prefeitos por desvio ou má aplicação de verbas (inclusive as federais – S 133 do extinto Tribunal Federal de Recursos), pois se configuram casos de crimes praticados contra o próprio Município; no mesmo sentido, a S 209 do STJ: “compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal”;
(b) Tribunal Regional Federal (TRF):
- crimes praticados contra bens, serviços ou interesses da União, de suas autarquias ou de empresas públicas federais;
- S. 208 do STJ: “compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal”.
(c) Tribunal Regional Eleitoral (TER): crime eleitoral;
II - Câmara de Vereadores: crimes de responsabilidade próprios, que são infrações político-administrativas, punidas com a cassação do mandato; estes crimes estão previstos no art. 4° do DL 201/67 e no§ 2 do art. 29-A: efetuar repasses em limites superiores aos definidos no art. 29-A, I-IV; não enviar o repasse até o dia 20 de cada mês; enviar repasse menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária.
III - todas as ações de natureza cível (ação popular; ação civil pública; improbidade administrativa etc.) seguem as regras normas de competência, não se lhes aplicando o foro privilegiado. Portanto, são ajuizadas em primeira instância.
[1] HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O federalista. Tradução de Heitor Almeida Herrera. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1984. HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O federalista. Tradução de Heitor Almeida Herrera. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1984.
[2] - poder regulamentar em sentido amplo: confunde-se com o poder normativo da Administração Pública em geral – atos infralegais de caráter geral e abstrato, como as portarias, instruções e resoluções ministeriais, instruções normativas das secretarias integrantes dos Ministérios, atos normativos expedidos pelas entidades da Administração Pública Indireta, como as resoluções do Bacen, da Anatel etc.
[3] MS 22706-1 – medida liminar – Diário de Justiça, Seção I, 5/02/1997, p. 1.223, Min. José Celso Mello Filho.
[4] MORAES, Alexandre. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2008, p. 477-478.
[5] ADI 1.021-2/SP, rel. p/acórdão Min. Celso de Mello, 19.10.1995.